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Suicidas

6 de outubro de 2018

| Gabriel Gómez




ÚLTIMO TREMOR



Galhos altos, como pássaros, abrem passo,

despencam da memória das folhas,

ninhos e trapézios arriscados

que não deixam

traços no ar.

O chamado se reduz a uma árvore quebrada,

refúgio da chuva,

sobre o cenário breve da vida.


Notam que o céu fica além das luzes,

além das sombras disformes tombando.


- Como vocês gostariam de morrer?

- Não como morremos, voando...


Mas quem poderá saber o que dizem,

quando esperam no chão, imóveis,

a pisada de quem passa

e não traduz o íntimo

de seu último tremor?



Gabriel Gómez -


do livro :   Suicidas-Os modos de falar à parede


editado em 2012








NÃO HÁ


Não há esperança.

Nenhuma.

Não há final feliz

qualquer.

Nem outro amanhecer

sem dor.

Haveremos de continuar

sem lágrimas,

respirando pouca luz,

este sonho, a vida distraída,

a justiça prometida,

o sempre.

Perguntamo-nos: e se alguém tivesse

invadido? E se permanecesse aqui,

envolvendo, convidando...?

Alguém que não soubesse

que não há esperança,

apenas postergações da mesma dor,

e mesmo assim, resgatasse a fé,

o abandono, um antes e um depois,

como se importasse,

como importam,

as coisas que foram, caíram,

que ninguém mais olha,

anteciparam sua morte, batendo,

batendo sempre a mesma porta,

e nós, acuados, no canto, sem querer ouvir,

porque não há ninguém,

ninguém para atender,

para levar ou trazer

seu amor.


Não há.



do livro - Suicidas - Os modos de falar à parede


de Gabriel Gómez - 2012.